DUELO AO SOL REVISITADO

DUELO AO SOL REVISITADO

Durante uma semana, Alberto Salazar viu a morte de perto. Um ataque cardíaco, no início de julho, mandou o norte-americano nascido em Cuba e tricampeão da maratona de Nova York para o hospital, onde sofreu uma cirurgia para colocação de stent (dispositivo que facilita o fluxo sanguíneo em pequenas artérias obstruídas).

Se fosse um romance, Salazar, talvez o maior maratonista dos EUA na história, veria um filminho de sua vida passar, ao se perder em dores. No filme, um dos grandes momentos seria seu duelo contra Dick Beardsley na maratona de Boston, em 1982.

Esse choque é exatamente o tema do livro Duel in the Sun (Duelo ao Sol, em português), do jornalista John Brant, colaborador constante da revista norte-americana de corridas Runner’s World. O autor lembra que muitos finais de maratona foram disputados metro a metro, mas, em 1982, os dois líderes ficaram juntos por 42.195 metros. E a definição foi por um segundo.

Para um corredor e jornalista, como este que vos fala, foi uma satisfação encontrar um livro de reportagem sobre uma maratona. É um dos raros do gênero entre manuais e títulos que descambam para o escorregadio terreno da auto-ajuda e biografias variadas.

A maratona de Boston não só é a mais antiga do mundo, mas também uma das primeiras que estabeleceu critérios de desempenho para aceitar a inscrição dos corredores. Junto com a de Nova York, esteve no centro do primeiro boom das corridas, no final da década de 1970 e início dos anos de 1980.

Por sua aura de nobreza, dificuldade de seu percurso e nomes que fizeram história em suas alamedas, a prova fascina os corações românticos dos maratonistas. Até hoje, muitos americanos amadores têm como objetivo obter o índice para participar daquela corrida. Outras maratonas, para atrair público e destacar um percurso plano e rápido, se apresentam como ótimas para qualificar para Boston.

Naquele ano de 1982, o frisson era ainda maior pela presença do jovem Alberto Salazar, 23, então bicampeão da maratona de Nova York. Na sua primeira experiência, em 1980, venceu com 2h09min41s, o melhor tempo da história para um debutante. No ano seguinte, conquistou a Big Apple com 2h08min13s, quebrando um recorde mundial que durava 12 anos – mas a marca não foi referendada, pois constatou-se que o percurso era menor que o oficial.

Beardsley, então com 26 anos, mesmo não tão charmoso ou reconhecido pela imprensa, também tinha vitórias importantes e prometia ser um desafiante audaz.

Competiram como nunca antes se vira, e suas carreiras prometiam decolar para a estratosfera do sucesso e do dinheiro. Mas Boston foi o canto do cisne de Salazar e Beardsley.

O garoto prodígio Salazar passou a ter resultados aquém da expectativa, caiu em depressão, descambou para a religiosidade exacerbada e conseguiu recuperar a alegria de correr na base do Prozac. Beardsley, o garotão do interior com vidinha rural, acabou viciado depois de sofrer um acidente de trabalho. Chegou ao crime para manter seu vício, mas conseguiu se reerguer.

Há problemas no livro. A voz dos personagens aparece mais por citação de jornais, revistas e programas televisivos do que por entrevistas feitas pelo autor. Além disso, o texto se refere com muita constância ao livro Staying the Course (Ficando na Estrada, em tradução livre), autobiografia de Dick Beardsley, escrita com a jornalista Maureen Andersen.

O autor também não esconde, tanto pelo que escreve como por quanto escreve, a simpatia por Beardsley. E cria dois estereótipos, em vez de deixar que os personagens se identifiquem por suas próprias palavras e ações.

Salazar é durão, sofisticado, altivo, prepotente – enfim, o dono da bola. O outro é um sujeito simples, ingênuo, boa gente, vítima das circunstâncias.

De certa forma, John Brandt “compra” a emocionada autobiografia de Beardsley, que traz o cheiro e o visgo dos cristãos-novos, dos viciados redimidos, que querem levar a todos a boa nova. O corredor, por sinal, encampou isso na sua trajetória – uma de suas atividades profissionais, hoje, são palestras em que conta a epopéia.

E Salazar também continuou, na vida profissional, a encarnar o super-homem. No hospital, recuperando-se do ataque cardíaco, não dispensou o celular para dar orientações aos corredores que treinava em Oregon, onde vive.

Salazar dá dicas de corrida
Em livro, Salazar preferiu não contar sua vida, mas transformou a experiência de corredor e técnico em obras e hoje é autor de livros que ensinam a treinar e a correr bem uma maratona.

Ele assina, por exemplo, Alberto Salazar’s Guide to Running: The Revolutionary Program That Revitalized a Champion (Guia de Corrida de Alberto Salazar: O Programa Revolucionário que Revitalizou um Campeão, em português), que custa US$ 16,95 (em média, R$ 32). No material de divulgação, Amby Burfoot, vencedor da maratona de Boston de 1968, elogia: “Muito completo e equilibrado”.

Outro livro com a grife Salazar, escrito em parceria com Richard A. Lovett, é Alberto Salazar’s Guide to Road Racing: Championship Advice for Faster Times from 5K to Marathons (Guia de Corrida de Alberto Salazar: Conselho de Campeonato para Tempos Mais Rápidos, de 5 km a Maratonas, em português), que tem o mesmo preço do outro, mas está com um pequeno desconto.

Há ainda uma obra sobre treinamento em esteira, escrita com a participação de vários autores: Precor Presents Alberto Salazar Treadmill Training and Workout Guide (Precor Apresenta: Guia de Treinamento em Esteira e Exercícios de Alberto Salazar, em português).


*Rodolfo Lucena, 53, é jornalista e ultramaratonista. Edita o blog +Corrida (www.folha.com.br/rodolfolucena), da Folha Online, e é autor de:

Maratonando, Desafios e Descobertas nos Cinco Continentes (editora Record)



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